Os bebês piscam, choram, bocejam semanas após o nascimento e às vezes sorriem. Mas essas ações significam que os recém-nascidos percebem o mundo de forma consciente ou são reflexos inconscientes?
Cientistas da Universidade de Nova York há muito estudam a consciência em adultos, pessoas com transtornos mentais e animais, mas compreender a consciência do recém-nascido tem sido um desafio. Pesquisas recentes, incluindo estudos sobre a atividade cerebral e os movimentos oculares dos bebês, sugerem que os recém-nascidos podem ter experiências conscientes, conforme detalhado no artigo de Claudia Passos-Ferreira na Neuron.
Passos-Ferreira explica que, embora a resposta final permaneça ilusória, evidências crescentes sugerem que a consciência começa cedo em bebês. Isso contrasta com teorias que sugerem que os bebês precisam de mais desenvolvimento cognitivo e maturação cerebral para se tornarem conscientes. Métodos criativos que medem a atividade cerebral de recém-nascidos apoiam essa ideia, apesar dos desafios.
Os bebês não respondem bem aos sinais verbais e muitas vezes dormem, dificultando o estudo de suas mentes. Passos-Ferreira observa que os neurocientistas consideram o cérebro e o comportamento infantis “ruidosos”, o que dificulta a extração de informações claras em comparação com os adultos.
O artigo de Passos Ferreira explora novos métodos que cientistas usam para determinar se bebês estão conscientes:
- medindo ondas cerebrais em resposta a sons inesperados
- imagens para estudar redes cerebrais
- rastrear movimentos oculares, como piscadas e alterações nas pupilas em resposta a estímulos
Esses estudos sugerem que processos cognitivos relacionados à consciência podem começar a funcionar em bebês mais cedo do que se acreditava anteriormente. O NYU News entrevistou Passos-Ferreira para discutir as últimas pesquisas sobre o surgimento da consciência durante o desenvolvimento humano.
O estudo da consciência infantil começou após focar no desenvolvimento do self e da moralidade. O pesquisador notou uma lacuna nas discussões filosóficas sobre o surgimento da consciência precoce, o que levou a uma mudança no foco da pesquisa.
Os investigadores investigam quando e como a nossa mente consciente se desenvolve, explorando fases onde diferentes capacidades cognitivas são adquiridas e como isso afeta as experiências conscientes. Por exemplo, a aquisição da linguagem altera o raciocínio, levantando questões sobre a consciência que as crianças têm do mundo e dos seus corpos.
Além da natureza barulhenta da atividade cerebral infantil, estudar a consciência em bebês apresenta outros desafios. Os bebês dormem com frequência, e a consciência requer vigília para teste. Seus estados de sono diferem dos adultos, alternando entre sono ativo e profundo, complicando a observação de seu comportamento.
Pesquisadores correlacionam a vigília com medidas fisiológicas como mudanças na frequência cardíaca. Bebês não conseguem responder a comandos verbais devido à sua incapacidade de se comunicar por meio da linguagem, diferentemente de animais treináveis capazes de tais respostas.
Nos adultos, o cérebro possui redes de consciência externa (quando nos concentramos no que nos rodeia e nas tarefas) e consciência interna (como sonhar acordado). Estudos recentes usando imagens cerebrais avançadas mostram que os bebês também possuem essas redes. Embora seus cérebros sejam imaturos, eles apresentam padrões semelhantes.
Por exemplo, quando os bebés ouvem sons repetitivos e depois uma mudança, os seus cérebros reagem com surpresa, semelhante aos adultos. Isto sugere que os recém-nascidos podem perceber e responder conscientemente ao seu ambiente, desafiando ideias anteriores sobre o desenvolvimento do cérebro infantil.
Pesquisas sugerem que a consciência provavelmente começa por volta de 26 semanas de gravidez, quando o sistema tálamo-cortical do cérebro se desenvolve. Antes disso, os fetos podem não ter as estruturas necessárias para a consciência, e produtos químicos sedativos no útero podem suprimir ainda mais qualquer consciência potencial.
Estudos indicam que fetos quase a termo podem processar estímulos conscientemente, desafiando suposições anteriores. Compreender a consciência infantil pode influenciar a forma como cuidamos deles, já que muitos acreditam que os bebês experimentam emoções.
Uma maior consciência pode orientar melhores interações e práticas de cuidado, reconhecendo o potencial dos bebês para sentir dor e outras sensações semelhantes às dos adultos, apesar do desenvolvimento cerebral contínuo.
Referência do diário:
- Claudia Passos-Ferreira, Podemos detectar consciência em recém-nascidos? Neuron. DOI: 10.1016/j.neuron.2024.04.024.